domingo, 31 de maio de 2015

Extinto há 50 anos, trem da Cantareira atendia zona norte e Guarulhos


31 de maio de 1965. Nas bancas, a Folha anunciava: “Corre hoje o último trem de Tucuruvi a Guarulhos”. Era o fim do Trenzinho da Cantareira, o principal meio de transporte da região norte de São Paulo durante seis décadas. O Tramway ligava o centro da cidade à Serra da Cantareira e a Guarulhos. A linha chegou a ter 45 estações e paradas e um ramal para a base aérea de Cumbica. No auge do movimento, em 1941, transportou 4 milhões de passageiros. A ferrovia foi inaugurada em 1894 apenas para
viabilizar a construção de reservatórios de água na Serra da Cantareira, mas logo a população pediu que o trem substituísse o transporte público de bondes puxados a burro. No início, a linha foi usada para passeios nos domingos e feriados. Com o tempo, as viagens passaram a ser diárias. Considerada obsoleta e deficitária, a ferrovia foi desativada aos poucos, os trilhos e dormentes retirados ou cobertos com asfalto e todas as estações demolidas, inclusive a do Jaçanã, famosa pela música “Trem das Onze”, de Adoniran Barbosa. O fundador do Museu Memória do Jaçanã, Sylvio Bittencourt, 84, diz que o cantor acompanhou pessoalmente a demolição. “O povo chorou quando ele cantou o trecho de ‘Saudosa Maloca’ – ‘Que tristeza que nóis sentia. Cada táuba que caía, doía no coração'”, revela.
Hoje, apenas uma parte da estrutura da estação Guarulhos permanece, abrigando uma unidade da Guarda Civil local.

Aproveitando o traçado ferroviário, a prefeitura paulistana construiu a ponte Cruzeiro do Sul, sobre o ainda limpo rio Tietê, e implantou vias para o trânsito de veículos. O custo do transporte público na zona norte subiu. As novas linhas de ônibus cobravam o dobro do preço do bilhete do trem. Para substituir o Trenzinho, em 1975 a linha 1-azul do metrô chegou a Santana, enquanto a extensão ao Tucuruvi foi entregue em 1998. Já as obras da ligação férrea entre São Paulo e o aeroporto de Guarulhos, pela zona leste da cidade, começaram no final de 2013. Segundo a CPTM, ao custo de R$ 1,788 bilhão, “a previsão é que a linha 13-Jade entre em operação a partir de 2017”, 52 anos após a última viagem do trem da Cantareira. O maquinista aposentado Joaquim dos Santos, 87, trabalhador na ferrovia até 1964, afirma que “interesses econômicos para construir avenidas e implantar linhas de ônibus” causaram o fim da linha. Antes de chegar a maquinista, Joaquim foi limpador de locomotiva e foguista, alimentando a fornalha do trem. Rindo, ele explica o apelido de Maria Fumaça dado às composições: “além da fumaceira, o trem soltava fagulhas que faziam furinhos nas roupas das pessoas. Era cheiro de queimado a viagem toda”.


 O aposentado diz que o Trenzinho também tinha a fama de casamenteiro. Ele mesmo foi vítima do “cupido ferroviário”. Numa tarde ensolarada, próximo à estação Tucuruvi, o maquinista avistou uma “simpática moça” no quintal de uma casa vizinha aos trilhos. Dos primeiros acenos tímidos, ele passou a acionar o apito sempre que o trem se aproximava daquela casa. “No começo, o irmão dela se opôs ao namoro, mas os pais consentiram e logo casamos”, relembra. O casal, Joaquim e Josefa, está junto há 65 anos.



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